Venham, a sério! Deixem o que por aí têm, nesses grandes da Europa. É que nós, por cá, temos um futebol em crescimento e com uma competitividade interessante. Veja-se que até temos os dois primeiros separados por apenas um ponto. Por aí não há competitividade desta.
Venham, sem receios! Já repararam que agora temos grandes gerações a crescer? Os clubes estão a apostar nas equipas B, nas academias e nos jovens portugueses, como vocês saberão pelo que veem na seleção. E os treinadores apostam nos miúdos, é engraçado porque dá o dobro do entusiasmo aos adeptos.
Venham, que isto até está bem distribuído. O Chaves voltou à Liga e está em grande, o Boavista está de volta à ribalta a dar mais força ao Porto (cidade), o Arouca e o Tondela são boas lufadas de ar fresco, o Paços remodelou o estádio, o Rio Ave está numa de ser europeu, os dois grandes do Minho estão em duelo aceso pelo quarto posto, o próprio Marítimo está com um novo embalo de fazer inveja a muitos clubes. E o Portimonense deve subir, portanto voltará a haver futebol no Algarve.
Venham mesmo, que temos também grandes treinadores, avançados vários anos no tempo, com métodos inovadores, grandes ideias, futebol atrativo, potenciação do jogador.
Venham... ou então... esperem um pouco...
Pensando bem, aqui o futebol tem sido cada vez mais segundo plano.
Pensando bem, aqui um jogo faz os adeptos arrancarem cabelos pelo que... não se joga. O anti-jogo assume proporções ridículas, os jogadores têm um hábito terrível de terem maior instinto para a queda do que para a finta.
Pensando bem, aqui perde-se a cabeça (como em qualquer lado pode acontecer) e um murro tem muito mais consequências de novela do que de futebol. Uns agarram-se a isso até vomitarem argumentos, outros refugiam a culpa em casos de há não-sei-quantos-anos.
Pensando bem, aqui a comunicação social enfatiza quase tudo o que mexe e depois colhe os frutos. Ou então é o contrário, já que este deverá ser o único país no mundo onde um órgão nacional vê rejeitada uma eventual reportagem/entrevista num clube de escalões inferiores porque «é uma altura decisiva e isso pode mexer com a estabilidade do grupo». Já nem sei bem quem começou por ter culpa. Mas sei que os verdadeiros protagonistas, aqueles que andam lá dentro a correr atrás da bola e a suar a camisola, estão num trajeto inversamente proporcional no mediatismo em relação a vários dirigentes.
Pensando bem, aqui os adeptos gostam é de clubes, não de futebol. Aqui importante é ver aquele programa de segunda à noite, recheado de nadas futebolísticos e de milhões de frames. Aqui importante é discutir legalidades ou ilegalidades de claques quando os reais problemas que daí advêm, como a pirotecnia ou os cânticos repletos de ódio, são ignorados quando podem justificar muito afastamento de famílias dos estádios. Aqui importante é ficar-se babado com os adeptos do Borussia Dortmund ou do Liverpool e ter práticas exatamente opostas às deles.
Pensando bem, aqui os clubes são completamente umbiguistas, não se conseguem unir para vender os direitos televisivos com outros proveitos, não abdicam dos jogadores emprestados que são demasiado bons para a B e ainda curtos para a A, mas que saem do clube que os recebeu sem darem um retorno diferente de... mais um emprestado na próxima época.
Ronaldo, lembras-te daquele desejo que várias vezes proferiste de um dia voltar ao Sporting? Moutinho, estás recordado das várias declarações onde falas com saudosismo do FC Porto? Bernardo Silva, não te esqueceste daquela tua espinha encravada e da vontade de um dia voltares a jogar com a camisola do Benfica, pois não? Olhem, talvez seja melhor ideia reconsiderarem. Talvez o nosso futebol seja mesmo demasiado (e cada vez mais) pequenino para vocês. Talvez possam continuar por aí. Talvez até possam aconselhar o Adrien, o Pizzi, o André Silva a juntarem-se a vocês.
O nosso futebol está doente. Lamento ser eu a contar-vos isto, mas ainda não é coisa que se possa dizer, apesar de todos os sintomas.
P.S.: Há muitos e bons intervenientes por cá, sejam jogadores, treinadores, dirigentes, jornalistas. Infelizmente, não tantos que tenham conseguido prevalecer o lado bom.