Alto! O FC Porto ganhou o campeonato. Alto aí! O FC Porto ganhou a Taça. A um ritmo alucinante, em tempos ímpares, confusos e inquietantes, vamos atropelando acontecimentos, porque o próximo está já aí. Sendo absolutamente normal e de total compreensão, até porque é sempre mais fascinante projetar o incerto do que fazer balanços do certo (que está terminado), parece-me da mais elementar justiça uma forte palavra de elogio para o que foi conseguido pela equipa de Sérgio Conceição.
Arredando desde já da conversa todas as questões estéticas, porque jogar bonito ou feio é uma avaliação subjetiva e que suscita outro tipo de análise, houve, no irregular relvado conimbricense, uma regularidade em 90 minutos: o FC Porto quis mais, confiou mais, acreditou mais. Mesmo depois de, de forma estranha e pouco explicável, ter vacilado animicamente quando todos os indicadores que o jogo dava lhe eram favoráveis. Continuou a querer mais, a confiar mais, a acreditar mais.
E a época portista foi muito isto. Claro que é impossível dissociar o seu sucesso do insucesso de um rival que tinha uma muito confortável vantagem e que, num ápice, deitou tudo por terra por razões que ainda hoje carecem de explicações. Anímicas, sem dúvida.
Ora, e aí esteve a grande diferença. Porque, se no estado de graça Benfica e FC Porto foram fortes (águias na primeira volta, dragões na reta final, depois de descolarem), na adversidade não restam dúvidas da muito maior capacidade da equipa de Sérgio Conceição, de faca nos dentes, a tentar de tudo para não descolar ainda mais que os sete pontos. Por contraponto com um Benfica alheado de confiança, a desperdiçar momentos capitais, como os jogos em casa contra Moreirense, Tondela e Santa Clara.
Em suma, se o FC Porto nunca deixou ao Benfica ter a sensação de estar no tapete, os encarnados fizeram-no reiteradamente, quando a diferença pontual (e o calendário) ainda sugeria clara incerteza.
De tão forte e acérrima que é a rivalidade entre os dois, não se espera que haja, por parte dos vencidos, o reconhecimento dos méritos aos vencedores. Não o houve na época passada, nem há duas, nem há três ou há 10, pelo que não é de estranhar que, por agora, o discurso para os lados da Luz seja de cabeçadas na parede por ter sido permitida a «tão fraco FC Porto, de Manafá e Marega» tamanha recuperação. Nada mais errado.
Fraco em quê? Qualidade técnica? De quem? Corona, Otávio ou Alex Telles? Pois em atitude e espírito de campeão também não será, ou não fosse Pepe o grande líder em campo. E de resto? Muito simples: se olharmos para o começo da época das duas equipas, qual a que conseguiu real valorização (desportiva, acima de tudo) dos jogadores? Vejam-se os casos de Otávio (quem o viu e quem o vê...) e Mbemba e encontre-se, no Benfica, evoluções destas neste último ano. Miragem...
Se tudo correu bem? Nem por sombras. Ficou por perceber a que se referia Conceição em janeiro, quando falou da falta de união no clube, ficaram na retina os sub-aproveitamentos de Zé Luís ou Saravia, ficou a sensação de que a irresponsabilidade de Uribe naquela festa o impediu (e a Marchesín, talvez um pouco menos) de ser uma das maiores figuras desta equipa, como sugere toda a qualidade que o colombiano tem, ficou ainda na retina a má campanha europeia. E é importante reter estes marcos da época, sem que alguma vez se sobreponham ao resultado final.
Porque o resultado final foi notável. Com Sérgio Conceição e a sua mensagem à cabeça, mas com um espírito coletivo vencedor que já há uns bons anos não vivia no reino do dragão.