Costumo dizer, de forma nitidamente parcial, que não há sítio mais completo que o zerozero. No que respeita ao tradicionalismo de um órgão de comunicação social, até pode ser um exagero, obviamente (temos tanto para crescer, ainda). Mas, e não é por acaso que todos os jornalistas com quem nos cruzamos nos garantem ser consumidores diários da plataforma, não há sítio em Portugal mais rico em informação futebolística. Certamente, e com orgulho.
Isto a propósito das centenas de milhar de jogadores que aqui têm o seu cantinho. Um espaço onde a dimensão da ficha do Cristiano Ronaldo é exatamente igual à do Filipe Soares, ou à dos meus irmãos Lucas e João ou do meu primo Gonçalo. Provavelmente, ninguém conseguirá conhecer um por cento dos 676.138 jogadores que aqui habitam.
De certeza que todos eles sonham ou algum dia sonharam chegar lá acima. Claro que sim. De certeza absoluta que só 9.582 conseguiram jogar na primeira divisão, em 86 edições. O anonimato é o estado reinante.
E podia também ser para Cláudio Ramos. Como tantos e tantos casos, um maior talento numa fase inicial da adolescência levou-o para fora de casa, para longe dos pais. De Vila Nova de Paiva até Guimarães são muitos quilómetros de estrada e muitas doses de saudade.
Quando chegou a hora de ser sénior, passou do Vitória para o Amarante, do quarto escalão (III Divisão). Depois, seguiu para Tondela, um degrau acima (II B). Passou a estar mais perto de casa, embora longe da titularidade, que foi maioritariamente do veterano Avelino. Deu-se a subida de divisão, mas, no segundo escalão, voltou a ser suplente no começo (os beirões contrataram Bruno Sousa para a posição) e teve de aguardar pela sua vez. A seguir, outra vez a ter vários períodos de banco. Claro que ainda era novo, com os seus 22 anos, só que os anos iam passando e as luzes da ribalta tardavam... e tardavam...
Em 2015, enfim, o horizonte há tanto tempo desejado: subida à primeira liga, noutra época em que começou a suplente, mas na qual fez o maior número de jogos. Já está a adivinhar, não já? Começaria a suplente, depois de contratado o inglês Matt Jones, e teria de esperar pela oportunidade para se mostrar. Teve-a e agarrou-a, para fazer parte do «Milagre - Parte I», essa velha saga que vai consolidando o Tondela na primeira.
Tanta a consolidação do clube aconteceu como o contributo do guarda-redes foi em crescendo. Sempre ele, enquanto uns chegavam e outros partiam, a revelar-se a figura da equipa, o símbolo do clube, o estandarte de toda a região.
De sorriso verdadeiro e dedicação extrema, Cláudio foi batendo recordes, do clube e do próprio campeonato, e só ao mais distraído pode ter surpreendido a ida à seleção. E nem a esse distraído pode ter surpreendido a sua chegada ao FC Porto.
Vai jogar? Inicialmente, muito provavelmente não. Mas quem melhor do que Cláudio Ramos para demonstrar que quem espera sempre alcança? Uma carreira que, apesar de ainda só ir a meio, deve constar nos manuais de todos os treinadores de jovens rapazes à procura do sonho. Os de Cláudio vão-se multiplicando e realizando. Porque, nunca se duvide, é mesmo possível!