*por Diogo Vidal Silva
«História, mística, raça e alma». As palavras que estão na âncora de um clube associado ao mar, à pesca e, principalmente, à massa adepta que segue com paixão o clube da sua região.
O emblema Alvi-Negro vive uma espécie de regeneração emocional e estrutural depois da queda para a Liga 3, mas este começo de época imaculada - cinco vitórias, dois empates - permite aos poveiros sonharem. Mesmo que o adversário seja... o Sporting, um dos gigantes do futebol português.
Mas há motivos para isso: em primeiro lugar porque outubro é o mês que vigora (já vamos lá); em segundo, porque pode surgir o famoso efeito «tomba gigantes» e, por fim, porque o histórico entre ambos os conjuntos deixou uma pegada que pode servir de orientação para o futuro.
Seguimos para lá, mais concretamente, para a última vitória do Varzim diante o Sporting - o mítico 25 de Outubro 1987.
Puxados pela corrente emocional e pelo farol Lúcio, os poveiros conseguiram derrotar os leões por 1-2, no antigo Estádio José Alvalade. Um feito histórico no emblema da Póvoa.
Henrique Calisto, ex-treinador de 68 anos, foi quem tripulou os Lobos do Mar rumo à vitória, mas foi Lúcio, ex-guardião internacional português, quem protegeu a equipa de um potencial maremoto.
Ambos, em entrevista ao zerozero, recordam o jogo emblemático de 1987, mas antes não esquecem as raízes de «um clube de família».
Um emblema histórico, «com mística e uma identidade muito própria». É assim que Henrique Calisto e Lúcio descrevem o Varzim SC, sublinhando a unicidade de ser um clube que representa o povo poveiro.
Lúcio também aponta um clube notado pela sua origem e pela massa associativa diferenciada das demais.
«É um clube muito notado pela sua origem e pela sua massa associativa familiar. Isto é, os filhos nascem e são logo sócios do Varzim e aquilo passa de geração em geração. Ser adepto de um clube grande é fácil, mas ser adepto de um clube como o Varzim...é diferente.
Os pescadores vinham do mar, iam diretamente ver os treinos e depois passavam o gosto pelo clube aos seus familiares. É uma identidade muito própria», elucidou o ex-guardião do emblema poveiro.
Postura, atitude, compromisso e dois pormenores táticos. Eis os ingredientes de Henrique Calisto para o sucesso em Alvalade, no ano de 1987.
«Acima de tudo, éramos intransigentes ao nível da postura, atitude e compromisso. Caso contrário, desvirtuaria a própria filosofia do Varzim. Em termos táticos houve algumas alterações claro. O Sporting tinha o Paulinho Cascavel - marcava muitos golos - e tenho a certeza que fizemos uma marcação muito mais em cima. Lembro-me que o ataque do Sporting com o Fernando Mendes era muito mais forte pelo lado esquerdo e, portanto, forçamos o lado oposto», explicou.
«Correu tudo bem», mas o Varzim não se livrou de sofrer, sendo que aí, segundo o ex-treinador, Lúcio esteve em destaque.
«Jogamos muito bem, o Sporting não era uma equipa qualquer. Lembro-me de vários grandes jogadores sportinguistas: Paulinho Cascavel, Duílio, Oceano, Fernando Mendes, Carlos Xavier, todos numa equipa fortíssima. Mas o Varzim entrou muito bem na primeira parte e fez dois golos. Depois, com o tempo, o Sporting ganhou ascendente. Nessa parte final, o Lúcio esteve muito bem: fez três defesas ao nível da classe que ele tinha, era um guarda-redes extraordinário, fantástico», referiu com muitos elogios para o ex-guardião luso.
O guarda-redes português, por outro lado, esclarece que o Sporting esteve por cima no jogo, mas enfatiza o «grito de guerra» da equipa poveira.
«Jogamos contra jogadores de seleção e eles vinham para cima de nós, lá tivemos de aguentar o ímpeto. Foi um sofrimento, é certo, mas nós tínhamos um lema que era: 'enquanto eles estão em cima de nós, é sinal que nós estamos a ganhar'. Era como um grito de guerra: 'malta, eles aqui não vão entrar mais!', e era a nossa forma de dar moral uns aos outros. Acabou por correr tudo bem», afirmou o ex-jogador.
Durante a entrevista, Lúcio rememorou algo, no mínimo, curioso. É que o Varzim tem cinco vitórias na sua história contra o Sporting e duas delas são...no mês de outubro. É coincidência? Para Lúcio, que esteve presente em ambos os jogos, pode não ser.
«Um no dia 24 de Outubro de 1982 e o outro no dia 25 de outubro de 1987, ambos os jogos - em diferentes anos -, mas em outubro! Foi uma festa tremenda. Acabei por ter ajudado porque em ambos os jogos tivemos que segurar a vantagem contra o ímpeto do Sporting. Acredito que as coisas se possam repetir, não é por acaso que o Varzim ganhou dois jogos em outubro», finalizou esperançoso em relação ao jogo do próximo domingo.
Dois animais diferentes e a caminhar em habitats desiguais. Um no terceiro escalão, o outro a lutar pelo título na primeira divisão. As forças são dispares, mas tanto Henrique como Lúcio acreditam numa surpresa.
Lúcio, por sua vez, relembra os feitos passados e aponta a fé como o elemento para atirar os leões fora da Taça.
«Acredito na vitória porque no futebol acreditei sempre, tudo é possível. É o meu lema da vida e a gente tem que ter fé. Sou uma pessoa positiva e o Varzim, mesmo com dificuldades e muito trabalho, pode passar esta eliminatória.
De ânimo leve é um bocado abusivo dizer que o Varzim vai ganhar, é muito difícil, mas acredito que a história se possa repetir», relembrando os feitos de outubro.
Henrique Calisto, por fim, acredita que o povo poveiro, mesmo sendo obrigado a deslocar-se a Barcelos, «vai-se movimentar». Lúcio, por sua vez, não tem dúvidas: Barcelos «vai estar cheio».
«Nós íamos daqui a Faro e levávamos sempre três camionetas atrás de nós, mesmo que tivessem de trabalhar no dia seguinte. É uma massa associativa que acompanha o muito o clube e nota-se que o Varzim, em termos de presenças nos estádios, só está abaixo do três grandes mais o SC Braga e o Vitória SC», exclamou Lúcio.
«Não tenho dúvidas nenhumas que Barcelos vai estar cheio. Vi filas para comprar bilhetes, acredito que vai ter casa cheia. Claro que também vão haver muitos adeptos do Sporting, mas, do Varzim, não tenho dúvidas nenhumas, vão estar muitos poveiros», rematou o ex-guardião.
É já no próximo domingo, 16 de outubro, que Varzim e Sporting se vão defrontar pela 49ª vez na sua história. De um lado, a esperança alvi-negra, do outro, a responsabilidade verde e branca.
1-0 | ||
João Faria 70' |