«Droit au but!», mais que um mote, tornou-se na definição do Olympique, com uma longa lista de goleadores a fazer jus ao lema. Desde os jogos filmados a preto e branco, Edouard «Doudou» Crut e Jean Boyer, passando por Pepito Alcazar, Josip Skoblar, Héctor Yazalde, Jean-Pierre Papin e Didier Drogba, os avançados marselheses foram sempre direitos ao golo.
O futebol chegou a França pelo norte, com marinheiros ingleses a introduzirem o jogo em Le Havre. Aproximadamente mil quilómetros separam a fria «Porta Oceânica», na ponta oposta do hexágono, da Marselha banhada pelas cálidas águas do mediterrâneo.
Muito mais que as temperaturas marítimas ou os quilómetros que separam a Normandia da Provença, a França sempre foi dois países, o «País de Oc» e o «País de Oil», as duas formas de se dizer «sim» na França Medieval, a França do Sul, latina, quente e a França do Norte, fria, céltica. Marselha, a mais velha das cidades francesas, que remonta a sua origem aos gregos, sempre foi uma orgulhosa cabeça do sul, oposição à distante e centralizadora Paris.
Cidade marítima, porto que atraiu gentes do Magrebe, do Levante, da vizinha Itália ou Espanha, nos seus arredores cresceram bairros de guetos de emigrantes, como o emblemático La Castellane, onde nasceria o mais mítico jogador marselhês, que o acaso nunca fez jogar com a camisola do L'OM. Cidade libertária, berço da «Marselhesa», o hino revolucionário francês, dentro das «quatro linhas», o Olympique encarnou esse espírito rebelde marselhês.
Os primeiros estatutos declaravam o Olympique como um clube eclético, votado à prática desportiva, com especial destaque para o futebol. Escolheram o branco como cor do clube por representar a pureza, adotaram o lema do FCM e estabeleceu-se uma quotização mensal, com o valor de três francos. Ciente da importância da quotização, Montmirail e os primeiros dirigentes deixaram bem claro no estatuto a obrigação de levar o símbolo do clube para todo o lado, com orgulho e como evangelização de novos membros:
«Todos os sócios devem possuir o escudo da instituição, cujo porte (na lapela) é obrigatório nos passeios, deslocações, concursos e festas.»
Os primeiros tempos foram de dificuldade, com o clube a só conseguir reunir nove jogadores para o primeiro jogo, contra o também marselhês US Phocéenne, que apesar das limitações, foi batido por um claro 4x0.
Cidade portuária, Marselha abria a porta aos estrangeiros, muitos deles jogadores de futebol. O l'OM estava atento e foi aceitando na sua equipa diversos jogadores das mais diversas proveniências. Iwens, Wood, Hyde, Browen, Knodler ou Van Ooy foram alguns desses ingleses, alemães e holandeses que ajudaram a criar a aura de clube aberto a todos, mesmo que isso significasse não participar em algumas competições que só admitiam clubes que alinhavam apenas com jogadores nascidos em França.
O pós-guerra trouxe diversas mudanças ao futebol francês. A velha liga e a USFSA deram lugar à FFF, fundada em Abril de 1919 por Jules Rimet, iniciando um processo que culminaria com a profissionalização no fim da década de 20.
Marino Dallaporta torna-se presidente em 1921, começando uma política da contratação de craques provenientes de outras regiões de França, como a dupla de avançados Crut e Boyer, resgatados em Paris. Vencedores da Taça de França em 1924, 1926 e 1927, os Olympiens viveram a sua primeira época dourada.
Os anos cinquenta começaram ao ritmo dos golos de Gunnar Andersson, melhor marcador do campeonato em 1952 e 1953, fundamental na primeira vez que o L'OM evitou a despromoção no seu historial.
Durante toda a década o Olympique vai-se afundando na tabela, salvando-se na última jornada em 1958, mas incapaz da redenção em 1959, ano da primeira «descida aos infernos» dos escalões secundários.
Sem receitas, o clube não consegue reagir à crise, sendo incapaz de regressar logo ao primeiro escalão. Perde jogadores, perde treinadores e os adeptos começam a virar-lhe as costas. Em 1964/65 arrasta-se pelo 14º da II Division, completamente divorciado dos adeptos, ao ponto de apenas 434 pessoas terem estado presentes no jogo contra o Forbach.
É contra este estado de coisas que um industrial de Marselha, Marcel Leclerc, chega à liderança do clube em 1965. Reestrutura o clube e recupera-o financeiramente. Um ano depois o L'OM estava de volta ao topo. Negoceia com a «mairie» de Marselha o usufruto do Stade Vélodrome, tentando conseguir uma subvenção.
Dentro do campo, o Marseille também começa a sonhar alto, com Leclerc a construir uma grande equipa. Em 1969 chega a Taça de França, em 1971 o Championat, graças aos 44 golos do jugoslavo Josip Skoblar - rei dos goleadores em todos os campeonatos da Europa - e à classe do sueco Roger Magnusson.
Um ano depois, o clube consegue uma histórica «dobradinha», a primeira da sua história. Tudo corria bem, mas em julho de 1972 Marcel Leclerc demite-se das suas funções, depois da acusação de ter retirado dinheiro do clube, que depois utilizou nos seus jornais. Sem o carismático presidente, o L'OM entrou num longo período de jejum e declínio, interrompido pela conquista da Taça em 1976, numa equipa onde brilhava o ex-sportinguista Yazalde e os brasileiros Jairzinho e Paulo César Lima.
Época após época, o Olympique ia perdendo competitividade, não estranhando nova descida de divisão. A despromoção à II Division e a crise financeira, levaram o clube a apostar num grupo composto maioritariamente por jovens locais, os minots. Seria esta equipa de miúdos da «cantera», de onde se destacava Éric Di Meco, que garantiu o regresso ao topo em 1984.
A 12 de abril de 1986, Bernard Tapie tornou-se presidente, com o apoio de Gaston Deffere - então Presidente da Câmara. Em pouco tempo pôs em prática o plano para tornar no seu Marseille a melhor equipa de sempre do futebol francês. Karl-Heinz Forster e Alain Giresse foram as suas primeiras contratações.
Entre 1989 e 1992, o Olympique de Marseille conquistou o tetra, batendo toda a concorrência e lançando a sua candidatura às competições Europeias.
Seguro o domínio do futebol francês, avança à conquista da Europa. Em 1990, chega às meias finais da Taça dos Campeões, caindo em Lisboa, literalmente à mão de Alvalade. Tapie sai de Lisboa irado, «brandindo» ameaças em todas as direções. Meses depois, mais calmo, com um sorriso de desdém, reconhecia que aprendera em Lisboa a conquistar uma competição europeia...
Um ano depois, nova final da Taça dos Campeões. Em Bari, um empate a zero com o Estrela Vermelha, só é «desatado» na lotaria das grandes penalidades. A sorte não quer nada com os olympiens que perdem a sua primeira final para os jugoslavos. Mais dois anos passados e nova final, desta feita o grande AC Milan pela frente. Jogo equilibrado, sem grandes emoções, desempatado antes do intervalo, no seguimento de um canto pelo cabeceamento Boli.
O Marseille é finalmente campeão europeu e dias depois revalidava - pelo quarto ano consecutivo - o título de campeão gaulês.Tudo corre bem, até que da distante Valenciennes, chegam as núvens que ensombram o céu marselhês. Era novamente o norte a cruzar-se no caminho do Marseille. Tapie defendia-se com a sua arma favorita, atacando sem pudor, com os velhos fantasmas dos «dois países», do norte invejoso do sul, mas a desculpa não pegava.
A justiça foi rápida e implacável: o Marseille foi despromovido à Segunda Divisão, perdeu o direito de jogar a Supertaça de França e Champions do ano seguinte, assim como a Supertaça Europeia e a Taça Intercontinental. Para cúmulo, viu-lhe retirado também o título de campeão europeu, que seria recuperado anos mais tarde, após uma batalha legal.
Dois anos depois, o regresso ao topo, com a presidência de Robert Louis-Dreyfus - e o apoio da multinacional alemã Adidas -, os Les Phocéens conquistaram um tímido 11º lugar, mesmo contando com craques como Fabrizio Ravanelli, Laurent Blanc e Andreas Köpke.
Na época de 1998/99 - no rescaldo da França campeã do mundo e para celebrar o centenário -, a direção construiu uma equipa de estrelas: Robert Pirès, Florian Maurice e Christophe Dugarry, que ajudaram o L'OM a chegar ao segundo lugar no Championat, atrás do Bordeaux, ao mesmo tempo que garantiam a chegada à final da Taça UEFA, perdida para os italianos do Parma.
Cinco anos mais tarde, os franceses voltariam a perder uma final europeia e novamente da Taça UEFA. Depois de terem eliminado vários colossos do futebol europeu, como o Inter de Milão, o Liverpool e o Newcastle, acabariam por perder na final frente aos espanhóis do Valência.
A nível interno, o início do século ficou marcado pelo domínio do Lyon, que foi campeão sete anos seguidos. Contudo, depois de todos esses anos, começou uma grande rotatividade a nível de campeões, com quatro campeões diferentes em quatro temporadas seguidas, e o Marseille esteve em destaque num deles.
Como se isso não chegasse, conseguiram ainda vencer a Taça, após baterem o Bourdeaux na final por 3x1. Na temporada seguinte acabaram o campeonato em segundo lugar, mas conseguiram conquistar uma Taça da Liga - algo que voltaram a conseguir na temporada seguinte.
Desde aí, o Marseille tem estado mais afastado da conquista de títulos, mas é um nome constante entre os primeiros classificados do campeonato. Na segunda década do século XXI chegou o domínio interno do Paris Saint-Germain, mas os olympiens ainda conseguiram fazer uma gracinha na Europa, voltando a uma final europeia 14 anos depois. Voltariam a perder, desta feita aos pés do Atlético de Madrid (0x3 na final da Liga Europa).
A nível doméstico, nesse período, o melhor que o clube conseguiu fazer a nível da liga foi um segundo lugar em 2010/11, 2012/13, 2019/20 e 2021/22. A penúltima foi sob o comando do português André Villas-Boas e significou o regresso à Liga dos Campeões passado um longo período de espera, mas um feito repetido dois anos depois por Sampaoli.