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Lviv

Texto por Pedro Dias
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Cinco nomes para a cidade das cem igrejas

Lvov (russo), Lemberg (alemão), Leopolis (latim), Lwów (polaco) e Lviv (ucraniano), cinco nomes para cinco identidades de uma cidade, que é a mais ocidental da Ucrânia, e não só por motivos geográficos...

A cidade que tem por lema Semper Fidelis [Sempre fiel] mudou de mãos ao longo do tempo, como poucas cidades ao longo da história. A «Cidade das fronteiras incertas», assim a denominou Delphine Bechtel, uma académica que estuda a multiculturalidade nas cidades do leste da Europa.
 
Vista panorámica do Castelo.
A própria edilidade, consciente desse passado, criou um novo logótipo que mostra cinco torres com cinco cores, como os cinco nomes da cidade, e resume a história de Lviv num mote universalista: «Lviv, open to the world» [Lviv, aberta ao mundo].
 
Sucessões e partições
 
Por aqui passaram os Ruténios, que fundaram a cidade que seria conquistada pelos tártaros, depois dos mongóis vieram os lituanos, os arménios, os polacos, os judeus, os alemães, os italianos, todos eles acrescentando mais uma camada ao substrato ruténio e ucraniano.
 
Englobada no Grão-Ducado da Lituânia, cercada pelos otomanos, pelos russos e cossacos, acabou por ser finalmente conquistada pelos Suecos. Em 1772, após a partição da Polónia, tornou-se austríaca, e assim permaneceria até ao fim da I Guerra Mundial, quando perante a retirada do Império Austro-húngaro e a Revolução no Império Russo, a Polónia e a Ucrânia reclamaram a independência e lutaram pela posse de Lwów/Lviv, e iniciou-se um conflito que terminou com a vitória polaca.
 
Passear pelas pequenas ruas de Lviv é como uma caça ao tesouro.
Lwów, manteve-se polaca até à II Guerra mundial, quando Hitler e Stalin partilharam a Polónia no famoso e ingnominioso «Pacto Molotov-Ribbentrop», conhecido pomposamente por «Pacto de Não Agressão Germano-Soviético».
 
Mas a «não agressão» foi chão que deu uvas e a cidade mudou de mãos, entre os dois, em pouco tempo. Primeiro foi ocupada pelos soviéticos e depois pelos alemães, até ser definitivamente conquistada pelo exército vermelho em 1944.
 
Perseguição e deportação
 
Durante a guerra, os judeus foram perseguidos pelos nazis, que assassinaram e deportaram mais de 80 mil pessoas, da mesma forma que os polacos foram deportados e os nacionalistas ucranianos foram perseguidos pelos russos, que não toleravam nenhuma forma de nacionalismo.
 
Transformada em Lvov após a sua incorporação na URSS, viu a sua população polaca ser enviada para Wroclaw, tornando-se numa cidade maioritariamente ucraniana pela primeira vez na história.
 
Os anos seguintes assistiram a uma forte russificação da Ucrânia e da própria Lviv, que viu a sua comunidade russa disparar para números superiores a 20% da população, quando nunca antes em toda a história da cidade, tinham ultrapassado o 1%.
 
Hoje Lviv é uma cidade multicultural e ocidental. Com cerca de 160 mil estudantes e mais de 100 igrejas, Lviv é a mais europeia das cidades ucranianas, com uma população maioritariamente católica (de rito grego), onde a identidade das suas diversas «personas» está estampada nos diversos bairros que representam diversas eras da cidade...
 
Teatro da Ópera de Lviv, um dos locais preferidos por locais e turistas.
Cada um dos povos que aqui viveu, deixou as suas marcas. Fossem conquistadores, comerciantes, missionários, sobreviventes, camponeses ou refugiados, todos, de igual modo, trouxeram para Lviv a sua história e cultura.  O Centro Histórico, Património Mundial da Humanidade, é uma joia de bom gosto e beleza intemporal. Desde os tempos do Barroco e do renascimento até à Belle Époque, passear por Lviv, é voltar ao Império Austro-Húngaro. 
 
Porta da Europa, Porta das Estepes
 
Da cidade gótica pouco resta, vítima de um incêndio no século XVI. Mas Lviv ainda tem o renascimento e o barroco presente em todo o lado, espreitando por cima do ombro de memórias mais recentes. As silhuetas das igrejas multiplicam-se, e ao contrário de Kiev e das outras grandes cidades ucranianas, aqui são as ortodoxas que são a exceção.
 
O passado multicultural ainda está presente nas igrejas das diversas proveniências, na velha catedral construída pelos arménios ou no que resta da forte influência judaica.
 
Mas o século XX acabou com a velha Lviv. Os judeus foram perseguidos e exterminados pelos alemães, os polacos foram expulsos, os alemães também, e os russos que se encontravam em Lviv em 1991, aos poucos começaram a abandonar a cidade. A história da cidade também se reflete nesses velhos blocos de cimento que o Império soviético aqui edificou.
 
Como a sua história, a geografia de Lviv é também ela acidentada. Sete colinas, como convém a uma cidade com história, fazem do passeio em Lviv, uma experiência sensorial e uma descoberta renovada... Subir e descer colinas, parar num jardim para descansar, olhar uma fonte onde crepita a água, encontrar uma esplanada para recuperar forças e aproveitar a boleia do voo dos pássaros em direção a uma praça onde à sombra das igrejas descansam as gentes, antes de começarem mais uma subida que promete uma nova vista sem fim...
 
Vista áerea do centro histórico.
Lviv é uma montanha russa de emoções, e faz bem à alma (e ao corpo) caminhar por entre as artérias que sobem e descem as colinas, mostrando mais além uma nova cúpula de uma igreja para visitar.
 
Tudo tem um tempo e o seu lugar na arquitetura de Lviv. A cidade Património Mundial, porta do ocidente para Ucrânia, porta das estepes orientais para a Europa. Uma das mais belas cidades que um viajante pode encontrar... Daqui se partiu e aqui se chegou, mas de partida, de chegada ou de simples passagem, todos ficaram com o coração mais cheio ao olharem as formas da bela e sedutora Lviv...
 
Hoje Lviv já não é uma cidade de passagem, mas ainda é uma fronteira incerta. Num país dividido pela herança soviética, Lviv é a cidade mais ucraniana da Ucrânia. Mais de 80% fala ucraniano (número sem igual no país), a população jovem olha para o ocidente e vira costas à Rússia, a Revolução Laranja pulsou aqui mais que em outra parte do país. Aqui que ao contrário do resto do país, as estátuas de Lenine já não têm lugar...

Comentários

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motivo:
IMPRESSIONANTE! . . .
2012-06-08 06h46m por LEAOSELVAGEM
Muitos parabéns pela iniciativa de incluir estes resumos histórico-culturais no site. Uma prova de que o futebol pode ser um vínculo de transmissão cultural e um partilhar de informações privilegiado.

Obrigado ao ZeroZero e ao autor
TE
Erro
2012-06-05 01h20m por teix
A Praça Central apresentadana imagem é de Praga e não de Lviv
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