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    Cultura do Futebol

    O Chelsea e o aipo

    Texto por João Silveira
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    «My salad days, / When I was green in judgment, cold in blood...» (1)

    No fim do primeiro ato de «António e Cleópatra» de William Shakespeare, a Rainha do Nilo expressava o arrependimento pelos seus arroubos da juventude, poeticamente lembrando os seus «anos verdes» e a relação amorosa com Júlio César.

    Nunca, de forma tão eloquente, os vegetais, ou a salada, tinham entrado na cultura inglesa e o mérito é todo devido ao grande poeta de Statford-upon-Avon. Todavia, a expressão «salad days» só entraria no discurso comum já no século XIX, aproximadamente pela mesma altura em que o futebol saía dos colégios e universidades ingleses e começava a caminhar para se tornar a paixão do povo.

    A expressão idiomática e o «desporto-rei» ganharam visibilidade na mesma época, mas durante anos e anos esta seria a única associação possível entre os vegetais e a bola. Se bem que era uma uma associação forçada... 

    Chelsea

    Seria graças ao Chelsea FC, o clube de bem londrino afeto ao bairro, que para muitos é a definição mais exata da quintessência londrina, que associação passou a fazer sentido. Tudo começou em Chelsea, um dos bairros mais nobres da cidade, desde sempre um favorito entre os intelectuais e artistas radicados na capital inglesa.

    Foi em Chelsea que viveram escritores como os irlandeses Johnatan Swift e Oscar Wilde, ou pintores como J. M. W. Turner e James Whistler. Foi também neste bairro que nasceu o movimento Pré-Rafaelita, e o próprio Dante Gabriel Rossetti viveu em Cheyne Walk, na rua onde mais tarde viveriam o Primeiro-ministro Lloyd George, os Rolling Stones Keith Richards e Mick Jagger, Marianne Faithfull, Vivianne Westwood ou a estrela do Manchester United, George Best.

    Mas voltemos ao Chelsea FC... Pois os azuis de Stamford Bridge - estádio curiosamente localizado em Fulham - seriam os responsáveis por trazer os vegetais para o futebol inglês e, em última instância, os responsáveis pela existência desta crónica. 
     
    O aipo chega ao futebol
     
    Tudo começou nos anos 80, quando um grupo de adeptos resolveu começar a cantar uma música com uma letra nada poética (2), popularmente conhecida como a Celery Song, a «Canção do Aipo» em português. O cântico começou a ser entoado no Shed End, a bancada sul do estádio, de onde começaram a ser atirados os primeiros aipos para o relvado. 
     
    Não havia um canto a favor de uma equipa adversária junto ao Shed End que não terminasse com uma chuva de aipos na direção dos jogadores. 
     
    Como muitas tradições populares associadas ao futebol, ninguém sabe ao certo como a ligação entre o Chelsea e o aipo nasceu. Alguns apontam Gillingham e o clube local como o berço da tradição. Segundo esta versão da história, Priestfield Stadium, o velho estádio do Gillingham FC, estava em tão más condições que começou a nascer aipo espontaneamente atrás de uma das balizas.
     
    Os adeptos insatisfeitos com o estado das coisas começaram a atirar o aipo para o campo. Alguns adeptos do Chelsea que acompanhavam os jogos do Gillingham acharam piada e levaram a «brincadeira» para Stamford Bridge.
     
    Com o passar dos anos, a coisa tornou-se séria e a final da Taça da Liga de 2007 chegou a ser interrompida com a chuva de aipos que caiu sobre os atletas do rival Arsenal. A direção dos blues, com medo de futuros castigos, decidiu banir o aipo de Stamford Bridge, criando até uma hotline onde os adeptos podiam anonimamente denunciar outros adeptos que levassem escondido o «perigoso» vegetal para dentro do estádio. 
     
    Num comunicado endereçado aos adeptos podia ler-se: «o ato de atirar seja o que for, incluindo aipo, para dentro do relvado durante um jogo de futebol é considerado crime, pelo qual pode ser detido e acusado, sendo presente em tribunal».
     
    A ameaça surtiu efeito e, apesar da contestação em fóruns online, os adeptos do Chelsea acataram a decisão e o aipo deixou de ter lugar na Premier League.

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    (1) - My salad days, / When I was green in judgment, cold in blood... - «Os meus anos verdes, / Quando eu era imaturo e inexperiente..» 
    (2) - Celery, Celery, If she don't come, I'll Tickle her bum, With a lump of Celery.

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    Lotação41798
    Medidas103x67m
    Inauguração0