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    Shakhtar Donetsk

    Texto por João Pedro Silveira
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    A fundação de Donetsk é ainda muito recente para ter uma história que se possa apresentar de forma sedutora ou romântica. Fundada há pouco mais de um século, em 1869, por John Hughes, um empresário galês que recebeu autorização do Czar para explorar as minas da região e abrir uma siderurgia, na distante província de Aleksandrovka, na Ucrânia oriental, Donetsk cresceu à sombra das grandes fábricas e da fuligem das minas.
     
    A cidade inglesa
     
    Hughesova, ou Yuzovka como os russos lhe chamavam, já tinha 50 mil habitantes quando chegou o século XX, tornando-se então a capital de uma região que era conhecida como a colónia dos ingleses. Foram os súbditos de «Sua Majestade», que acompanharam Hughes, que moldaram a cidade do nada, e legaram a arquitetura e a orientação das ruas com as suas casas de tijolos tipicamente ingleses e uma praça central com uma igreja anglicana.
     
    Mas da Donetsk inglesa pouco resta, além de um ou outro pequeno edifício de tijolos vermelhos, como a casa onde Hughes viveu, tudo se perdeu com a rápida e desenfreada industrialização do século XX, além da revolução e da II Guerra Mundial. Do pouco que resta, além da tradição mineira, resta o futebol, uma paixão «importada» pelos ingleses que trabalhavam nas indústrias de Hughes.
     
    A empresa de John Huges seria a responsável pela fundação do Yuzovka Sports Association que existiu até 1919. Durante os anos 20, o clube reorganizou-se com a denominação de Lenine, o grande líder da revolução russa.
     
    De Yuzovka a Stakhanovets
     
    Em 1917, vésperas da Revolução Bolchevique que derrubaria o governo da República liberal de Kerensky, que por sua vez já havia derrubado o Império dos Czares alguns meses antes, Yuzovka ganhou o estatuto de cidade e após a chegada dos bolcheviques ao poder, passou a chamar-se Stalino, em honra do aço que aí era produzido.
     
    Os comunistas trouxeram um novoa denominação, mas também trouxeram a canalização de água e o primeiro sistema de esgotos da cidade. Seria durante esse período que Alexei Stakhanov ,um mineiro local, se tornou um herói nacional da U.R.S.S., graças aos números da sua produtividade.

    Os dirigentes comunistas usaram-no como um símbolo da superioridade da nova sociedade socialista, e o seu nome andou nas bocas do país, como um exemplo a igualar. Em sua honra o Shakhtar (que literalmente quer dizer mineiro), clube dos mineiros locais que nascera em 1936, nasceu com o nome de Stakhanovets.
     
    Anos difíceis

    A primeira equipa do Stakhanovets inspirou-se em duas equipas proletárias ucranianas: Dynamo Horlivka e o Stalino. Apesar das derrotas iniciais, o clube rapidamente progrediu, chegando ao primeiro escalão antes de terminar a década. 
     
    Em 1941, em vésperas da invasão alemã, seguia em quinto lugar quando a competição foi suspensa. O último jogo, seria jogado a 24 de junho, dois depois do começo da «Operação Barbarossa». Os mineiros foram derrotados pelo Traktor Stalingrad. A Ucrânia seria um dos principais alvos da ofensiva alemã. 
     
    A Guerra relegava o futebol para segundo plano...
     
    Nova vida
     
    Os exércitos do III Reich avançaram pela Ucrânia. E Donetsk era um dos grandes objetivos. Os nazis procuravam apoderar-se das minas, fundamentais para o esforço de guerra soviético.  
     
    As forças alemãs apoderaram-se das minas, mas não das fábricas, que entretanto haviam sido deslocadas para leste…
     
    Os alemães arrasaram Stalino, assassinando a comunidade judaica e transformando a cidade num imenso campo de concentração em volta das minas que exploraram avidamente.
     
    Dos 507 mil habitantes que havia antes da Segunda Guerra Mundial, só 175 mil restavam quando o Exército Vermelho libertou a cidade a 5 de setembro de 1943. Depois da guerra, e da morte de Estaline, a cidade ganhou um novo nome, quando Krushev resolveu mudar o nome de Stalino, muito próximo do nome ditador, para Donetsk.
     
    Renascimento
     
    E é esta história que envolve ingleses, bolcheviques e alemães, minas de ferro e de aço, fábricas e siderurgias fumegantes, que empresta uma singularidade e interesse a Donetsk, senão a cidade não passaria - nas palavras dos locais - de uma terra com um clube de futebol em cima de uma mina.
     
    Mas não só a cidade mudou de nome no pós-guerra. A empresa que geria as minas, a Stakhanovite, passou a chamar-se Shaktyor e com ela o clube que lhe estava associado. 
     
    Aos poucos, a normalidade voltou à cidade e ao clube. Em 1950, a sua estrela, Viktor Fomin, era considerado o melhor jogador ucraniano do ano. Um ano mais tarde, a equipa conseguia um impressionante terceiro lugar na Primeira Divisão Soviética. 
     
    Crescimento
     
    Na década de 60 o Shaktar, com Oleg Oshenkov no banco, conquistou a Taça da União Soviética em 1961 e 1962, com uma equipa onde pontificavam nomes como Viacheslav Aliabiev e Vladimir Salkov. 
     
    Depois de uma terceira final perdida em 1963, o Shakhtar só voltou ao grande jogo em 1978, perdendo novamente. Seria preciso esperar mais dois anos para os «mineiros» levantarem o famoso troféu de cristal.
     
    Os anos 80 seriam profícuos em finais da Taça, com o Shakhtar a vencer novamente em 1983, antes de perder a grande decisão em 1985 e 1985. Em 1983, a juntar à Taça, o Shakhtar conquistara também a supertaça. 
     
    Independência e rivalidade com Kiev
     
    Quando chegou o fim da União Soviética e a Ucrânia ganhou a independência, o futebol local tinha no Dynamo de Kiev a sua maior potência, que com 13 títulos conquistados era o clube com mais troféus de campeão no palmarés, à frente dos grandes potentados de Moscovo: Spartak (12), Dynamo (11) e CSKA (7).
     
    O Dniepr Dniepropetrovsk (FC Dnipro) era o grande adversário do colosso de Kiev, conquistando duas ligas e dois vice-campeonatos nos últimos anos e o Shakhtar surgia então como uma terceira força, ao nivel do Chornomorets Odessa. Mas contra todas as expectativas, o primeiro campeão do pós-independência ucraniano tinha sede na Crimeia: o SC Tavriya Simferopol.
     
    Contudo, rapidamente o Dynamo Kiev fez valer a sua força e conquistou uma impressionante sequência de nove títulos. Durante esse período o Shakhtar afirmou-se como segunda melhor equipa do país, terminando cinco vezes seguida na segunda posição, antes de roubar o título aos da capital em 2001/02. 
     
    A força do dinheiro
     
    Em Outubro de 1995, o rebentamento de uma bomba triou a vida ao Presidente Akhat Bragin, que seria substituído no ano seguinte por Rinat Akhmetov. O «Senhor Dinheiro» que começou a revolucionar o clube.
     
    Sem olhar a custos, Akhmetov investiu fortemente no Shakhtar. O italiano Nevio Scala conduziu o clube ao título, com uma equipa cheia de craques ucranianos como Anatoliy Tymoschuk, Andriy Vorobey, Hennadiy Zubov e Mykhaylo Starostyak.
     
    Durante oito épocas, Shakhtar e Dynamo dividiram o Campeonato entre si, com quatro títulos para cada um. A grande revolução do futebol ucraniano começou com a contratação do romeno Mircea Lucescu, em Maio de 2004. Em poucos anos, Lucescu acabou com os campeonatos ocasionais do Shakhtar, para tornar o Shakhtar campeão, quase um facto crónico do futebol do país. 
     
    Com Lucescu, os «mineiros» paulatinamente contrataram algumas das mais promissoras estrelas da América do Sul, Brasil em particular, juntamente com craques dos países de leste e do mercado local.
     
    Em 2009  o Shakhtar conquistou a Taça UEFA, o primeiro troféu internacional do seu palmarés. Na época seguinte iniciou uma impressionante sequência de títulos que transformaram o clube de Donetsk na maior potência desportiva da Ucrânia, no começo da segunda década do Milénio. 
     

    O fim da era Lucescu e a sucessão lusa

    Mircea Lucescu manteve-se no clube até 2015/16, época em que falhou pela segunda vez consecutiva a conquista do título – algo que já não acontecia desde 2003/04, ano em que entrou no clube - e que marcou o fim de uma era de sucesso interno e internacional sem precedentes na história do clube. O técnico que trouxe o ADN brasileiro até Donetsk deixou uma herança muito pesada – uma Taça UEFA, oito Campeonatos, seis Taças e sete Supertaças, mas a sucessão foi à altura.

    Paulo Fonseca devolveu o Shakhtar ao topo @Getty /
    A direção do Shakhtar parecia feliz com tudo o que o sotaque português ofereceu ao clube e apostou em Paulo Fonseca. O técnico português chegava de um grande trabalho no SC Braga, mas teria agora a verdadeira prova de fogo após o falhanço ao serviço do FC Porto, ainda por cima numa equipa em mudança e já sem alguns dos principais craques que elevaram o patamar do emblema de Donetsk.

    No entanto, a experiência, que até começou com o pé esquerdo com a derrota na Supertaça e a eliminação na fase de qualificação da Liga dos campeões aos pés do Young Boys, dificilmente podia ter corrido melhor. Em três anos, Paulo Fonseca conquistou três Campeonatos, três Taças e uma Supertaça, tendo ainda atingido os oitavos de final da Liga dos Campeões numa ocasião.

    No final 2018/19, o Shakhtar estava de volta ao topo do futebol ucraniano, a uma distância larga dos rivais, e jogava um futebol atrativo, que valeu a Fonseca a oportunidade na AS Roma. Terminada mais uma fase, o emblema de Donetsk repetiu a receita com a aposta em Luís Castro para a temporada de 2019/20. O novo treinador português do Shakhtar teve uma época de estreia em grande, foi campeão e chegou às meias finais da Liga Europa, sendo a grande sensação dessa edição da prova, mas acabou por sair em 2021 e foi substituído pelo italiano Roberto De Zerbi, depois de uma época abaixo das expectativas.

    O treinador transalpino encantou a nível interno com um estilo de futebol positivo, retomando o Shakhtar ao caminho dos títulos internos e potenciando nomes como Mykhaylo MudrykDodôMarcos Antônio ou Manor Solomon e ele próprio acabou por, em 2022, dar o salto para a Premier League (para comandar o Brighton). Ora, isto coincidiu com um período negro para o futebol ucraniano. 

    É que em fevereiro de 2022 a Rússia reacendeu o velho conflito com a Ucrânia, invadiu o território ucraniano e espoletou um conflito armado que estava adormecido há algum tempo. Isto levou à paragem do campeonato da Ucrânia durante algum tempo e ao êxodo da larga maioria dos intervenientes desportivos estrangeiros, com a liga, e o Shakhtar a sofrerem com essa perda de talento, embora isso não tenha impedido os de Donetsk de somar o seu 14º título de campeão.

    Comentários

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    motivo:
    Parabéns Zerozero
    2014-09-30 17h45m por Ahly
    Adoro esta iniciativa de colocarem a história dos adversários das equipas portuguesas na Champions! Só é pena não terem feito o mesmo para o Rio Ave e o Estoril na Liga Europa, espero que comecem a fazer em breve!
    Estádio
    Donbass Arena
    Lotação51504
    Medidas105x68
    Inauguração2009