O empate do Benfica em Paços de Ferreira tem assumido, no seio dos adeptos encarnados, contornos de drama. Ora é pela qualidade futebolística da equipa, ora é pela venda de Gonçalo Guedes, ora é pela repetição constante de opções de Rui Vitória. Tudo tem fundo de verdade. Mas só fundo, embora crescente de tema para tema. Não vejo que exista uma crise na equipa, embora veja alguns focos a precisarem de reflexão.
Em matéria de qualidade futebolística, é verdade que existe uma grande oscilação do Benfica encantador na Luz para o Benfica resultadista fora de casa, sobretudo em jogos a Norte. Ainda assim, esta foi uma exibição bem mais consistente e capaz do que as duas últimas deslocações, onde se viram vitórias tangenciais em Braga e Santa Maria da Feira, com boa dose de felicidade à mistura. Parece-me que a exibição em Paços de Ferreira foi melhor - faltou o que Rui Vitória disse, a finalização.
No que diz respeito à venda de Gonçalo Guedes, poderá ser um aspeto relevante se virmos a pouca eficácia de Jonas (três golos nos últimos nove jogos) em relação à época passada... mas não em relação ao português (sete golos em 28 partidas). Seria sensato deixar o brasileiro no banco? Não, pelo que sobraria espaço para Guedes nas linhas. E assim passamos para o terceiro tema.
As repetições de Rui Vitória nas escolhas pecam pelos extremos. Ou seja, obviamente o treinador do Benfica não pode fazer maior gestão que a que fez no setor defensivo: jogam Semedo, Luisão, Lindelöf e Eliseu (porque não há Grimaldo), tendo as taças servido para dar minutos a Jardel ou Lisandro. No meio, e não entrando nas questões do estranhíssimo caso do departamento médico, há pouca margem para poupar um imprescindível Pizzi, enquanto se (des)espera pela recuperação de Fejsa. Do ataque, a influência de Jonas é inquestionável e o momento recente de Mitroglou sugeria a sua continuidade.
O principal problema futebolístico está nos extremos. Curiosamente, a vertente que era apontada como a de maior qualidade nesta equipa. E aqui Rui Vitória tem culpa. Sendo essas as posições mais sujeitas a picos e consequente desgaste, sendo também essas as posições que mais sugerem criatividade e capacidade de desequilíbrio, parece haver um défice nesta gestão. Salvio está em quebra notória, Zivkovic tem decidido mal nos cruzamentos. Cervi, na sua primeira quebra de forma, saiu da equipa e, mesmo sendo mais agitador em 15 minutos que os titulares, não regressa a um lugar que parece fazer todo o sentido ser seu. E há ainda Carrillo, que teve como consequência de um ligeiro ascendente... a ida para a bancada. Sem o virtuosismo dos habituais extremos, o Benfica perde uma das suas grandes armas e vê-se obrigado a solicitar vezes sem fim as piscinas dos laterais.
De qualquer forma, o maior problema psicológico do Benfica tem sido um FC Porto... à Benfica (em alusão ao que as águias fizeram na época passada). Em jeito discreto, sem nenhum futebol de encantar, a equipa de Nuno tem tido uma consistência totalmente diferente desde a chegada de Soares e esta é uma concorrência que não parecia estar na equação. Por alturas de outubro/novembro, eu não contava, admito.
De repente, chegaremos ao clássico com a equipa de Rui Vitória atrás (se os portistas cumprirem a sua missão contra o Vitória de Setúbal) e ainda com uma ida a Alvalade até fim da época. De repente, a necessidade de vitória passou a ser maior para os encarnados. Que grande luta a dois aqui temos!