É uma pergunta que não deveria merecer contestação na resposta. Mas que poderá, feita de outra forma, suscitar respostas curiosas. Se eu perguntar a um adepto comum em Portugal se prefere que o seu clube ganhe a Champions ou a Liga NOS, por ordem de grandeza, a resposta será quase sempre a primeira. Mas, se eu perguntar se prefere ganhar a Champions e ver o grande rival ganhar o campeonato, de certeza que há quem mude de opinião. Mais mudará se eu perguntar, de forma específica, a um benfiquista a sul: «Abdicas de uma Liga para o Sporting do Jesus para ganhares a Champions?»; ou a um benfiquista a norte: «Preferes ganhar o campeonato ao FC Porto ou vê-los ganhar e ganhares tu a Champions?»; ou ao contrário, a um portista ou sportinguista: «Querias ganhar a Champions, mesmo sabendo que ias ter os benfiquistas a festejarem o campeonato?».
Uso estes três emblemas por serem os mais representativos em adeptos e títulos, embora pudesse utilizar outros. Não condeno rivalidades. Condeno ódios. Porque, em Portugal, fazem com que o nosso futebol esbarre eternamente à porta do top-5 europeu. Podem dizer-me que a matéria-prima é escassa à beira de Inglaterra, Espanha, Alemanha. Não nego. Mas também não se pode dizer que a matéria mental abunde.
Nomeadamente na ambição. Talvez muitos ainda me estejam a chamar nomes pelas alusões do primeiro parágrafo. Mas, se aumentar o ratio para «uma Champions ou cinco campeonatos?» o assunto tomba de vez. E isso é preocupante. Porque não importa mais ganhar do que não perder para o vizinho.
Claro que não se muda o cenário de um dia para o outro. Mas, em Portugal, não se quer mudar. Quantos benfiquistas ontem disseram: «Vamos ao tetra, que isso é que interessa»? Como há uns meses os sportinguistas falavam de três competições internas quando saíram de forma lamentável da Champions. Ou como irão falar os portistas daqui a uma semana (a menos que aconteça uma barcelonice em Turim).
Esse é o propósito: ganhar o campeonato. E é cada vez mais, reféns que somos do «fosso cada vez maior entre grandes e pequenos» na Europa. Pudera! Nós temo-lo cá. Luís Filipe Vieira, numa recente entrevista à CMTV, regozijou-se da «visão europeia» a longo prazo que o Benfica eventualmente terá. Mas como se poderá ser maior lá fora se cá dentro o campeonato não cresce na competitividade? Como se poderá ter um melhor campeonato se, na altura de negociar os direitos televisivos, cada um vai para seu lado para depois se ver quem é que tem o maior negócio?
Rui Vitória inventou, sim. Eliseu e Salvio espelharam as suas debilidades, claro. Fejsa e Grimaldo fariam daquele um jogo muito diferente, talvez. Só que o problema continua a ser cultura (e não estou a dar nenhuma novidade com isto) futebolística. As rivalidades nada têm a ver para o caso, volto a dizer. O umbiguismo e o egocentrismo têm tudo!
A mentalidade dos dirigentes é reflexo da que os adeptos apresentam, da sociedade, da forma mesquinha como se vive um futebol ao estilo Big Brother. E a culpa não morre por aí. A comunicação social também a tem. Nesta quarta-feira, fui à conferência de Nuno Espírito Santo e, ao chegar à redação, bateu-me a conclusão de que não tinha sido feita uma única pergunta sobre arbitragem. Inédito em 2017, pensei.
Deixo apenas uma questão para o adepto: caso avance a Superliga Europeia (vai avançar, mais cedo ou mais tarde), prefere que o seu clube seja o único representante português ou que os rivais também lá estejam, correndo o risco de fazerem melhor figura na prova? Sim, guarde a resposta.
P.S.: Este tema, mais que um artigo, dava um livro. Por isso, muita coisa ficou por aprofundar. Mas conto voltar a ele. Provavelmente, quando me apetecer escrever sobre a equipa que perderá lugar na Champions em 2018 e os adeptos do terceiro classificado da próxima época se lembrarem que, afinal, é lamentável "não haver" quem faça pontos para o ranking