Há (meias) mentiras que contadas muitas vezes acabam por se tornar chavões. A Taça da Liga portuguesa é disso um excelente exemplo. Há 10 anos que se conta com a leviandade com que muitos tratam o futebol que só existe para beneficiar os três «grandes». Os vários modelos competitivos da prova têm servido de argumento base para os defensores dessa tese, ainda que os resultados práticos estejam longe de comprovar esse mito que se vai eternizando.
Senão vejamos: com os quatro semifinalistas da 10ª edição da Taça da Liga confirmados, só o Benfica está presente desse grupo restrito de alegados «beneficiados». FC Porto e Sporting, por sua vez, ficaram-se pela fase de grupos, apesar de uma aposta mais ou menos assumida na competição, comprovada até pelas boas assistências no Dragão e em Alvalade.
Numa análise global ao historial da prova percebe-se que o cenário atual é, afinal, bem frequente: só por duas vezes (2008/09 e 2009/10) - em 10 anos, recorde-se - é que Benfica, FC Porto e Sporting estiveram em simultâneo nas meias-finais; e só em duas edições é que se assistiu a uma final entre «grandes» (2008/09 e 2009/10). Factos irrefutáveis, apesar de discutíveis na sua génese.
Outro facto pouco explorado quando se decide «atirar pedras» à Taça da Liga é o critério de distribuição das equipas nos grupos. Aí conta a classificação das equipas nas respetivas ligas (Primeira e Segunda Liga). Logicamente que águias, dragões e leões vão beneficiar do estatuto de cabeças de série, mas esse é um «problema» que reside na realidade do futebol português e não no critério em si. Quando o Sporting foi 7º classificado em 2012/2013, por exemplo, acabou por ficar no grupo do FC Porto. São regras com um fundamento, goste-se ou não.
Não vejo a mesma convicção nas críticas aos modelos de outras competições, como a Liga dos Campeões. Também aí existem cabeças de série e também aí os «grandes» são protegidos numa primeira fase. Ou na própria Taça de Portugal, onde vários emblemas do primeiro escalão só entram em cena em fases mais adiantadas, ao contrário de países como a Alemanha, por exemplo. Mas poucos ousam apontar o dedo à «Prova Rainha», por uma questão de estatuto, talvez.
Num país tripartido na semântica do futebol, talvez o facto de um dos «grandes» ter um domínio avassalador na Taça da Liga - no caso o Benfica - possa contribuir para o menosprezo sem fundamento dos outros dois terços. E mais incompreensível são as críticas de outros emblemas fora deste G3. Afinal, Vitória de Setúbal e SC Braga enriqueceram os respetivos palmarés graças às conquistas na Taça da Liga; o Marítimo tem duas finais (tantas como em 62(!) participações na Taça de Portugal). É uma prova que valoriza e que enriquece quem lhe prestar a devida atenção.
Para terminar, e ainda a propósito da importância dos «grandes», permitam-me que diga o seguinte: em Inglaterra, Liverpool (8) e Chelsea (5) são os clubes com mais conquistas na Taça da Liga; em França, Paris SG (6), Marselha (3) e Bordéus (3) surgem no topo dos vencedores da mesma prova. Ou seja, os «grandes» de qualquer país vão sempre surgir na linha da frente, independentemente da prova. É uma questão histórica.