*Com Ricardo Rebelo
Caótica, imprevisível, dolorosa. Não é particularmente linear mas é assim que se pode caracterizar a situação que se vive na Associação Desportiva Oliveirense, equipa que milita atualmente na Série A do Campeonato de Portugal e que se aproxima cada vez mais do abismo, dado os problemas que afetam o seio diretivo de uma estrutura que, apesar de apenas albergar a equipa sénior, ameaça terminar, definitivamente, enquanto gerida por uma Sociedade Anónima Desportiva (SAD).
Numa época marcada pela dificuldade, a instituição da pacata freguesia de Santa Maria de Oliveira, Vila Nova de Famalicão, sofreu um rude golpe depois de, no final do passado mês de fevereiro, ter sido decretada a insolvência da SAD da AD Oliveirense, de forma consensual entre todos os credores presentes em assembleia, diga-se. Tal decisão, para além de significar a impossibilidade de gerir a entidade, cessou automaticamente todos os contratos de trabalho, abrindo o precedente que faltava para despoletar todo o alarmismo que tem ecoado pelos sócios, adeptos e simpatizantes do clube minhoto.
Em declarações ao zerozero, Vítor Bastos, experiente defesa-central que capitaneou a equipa ao longo da temporada, confirmou os problemas em relação aos atrasos no pagamento dos salários, no entanto, não escondeu a sua surpresa sobre a forma como a situação se sucedeu, alertando que, apesar do plantel estar ciente da situação delicada em que o clube se encontrava, já tinham existido momentos mais desconfortáveis.
«De certa forma fomos um pouco apanhados de surpresa. A questão salarial não era uma questão em grande falta, só tínhamos janeiro por liquidar e entretanto iria vencer fevereiro. Nada indicaria o encerramento desta entidade, contudo, sabíamos de forma leve pelo administrador da insolvência que em janeiro aconteceria uma audiência em tribunal e onde isso podia acontecer mediante a decisão de alguns credores. Vendo bem, nós tivemos fases bem piores esta época em termos de problemas no grupo a nível de salários, isto em outubro, novembro, salvo erro… Não era nesta fase em que tínhamos apenas o mês de janeiro que estaríamos à espera do encerramento do clube».
Agora no Gondomar, o jogador de 29 anos abordou a reunião com elementos da SAD, revelando que os atletas do plantel principal se viram «entre a espada e a parede», já que, numa situação tão instável, foram obrigados a decidir o seu futuro num curto espaço de tempo para evitarem sair prejudicados a nível profissional.
«Nós tivemos essa reunião no dia seguinte à audiência em tribunal, salvo erro foi na quinta (27/02), nós reunimos na sexta (28/02), no clube, às 15 horas, a fim do administrador da insolvência nos dar um documento a comprovar o encerramento do clube e que os atletas estariam livres e poderiam procurar trabalho visto que a Oliveirense SAD foi extinta. Um pouco antes dessa entrega dos documentos estivemos reunidos com alguns dirigentes da SAD e disseram-nos que iriam pedir recurso e que as coisas iriam reverter, que iriam pagar o mês de janeiro e, consecutivamente o mês de fevereiro, que nessa data ainda não tinha vencido», rematou Vítor, que, a par de outros elementos do restante plantel, encontrou colocação para continuar a competir até final da época.
«Muitos de nós e eu também incluído tentamos logo procurar solução porque é uma situação que nos criou muita instabilidade a nível emocional e a todos os níveis porque ficamos com receio de não podermos jogar mais até ao final da época. O mercado fechava na sexta (inscrições no CP) e não sabíamos se a federação abriria alguma exceção, e isto criou aquela indefinição e aquele receio», completou.
Vítor não terminou a sua intervenção sem antes apelar à cooperação das entidades competentes para a resolução dos problemas criados por esta situação, atirando para cima da mesa as debilidades que existem no futebol português nesta matéria: «Espero que consigam solucionar a vida de muitos dos atletas que passam por situações raras e difíceis tais como esta, que os ajudem de forma urgente a avançarem no processo e de forma positiva. E que todas as entidades, juntas, se unam para que ao invés de trabalharem na resolução dos problemas se unam para a prevenção deles porque em Portugal temos muitas falhas».
Há que separar as águas. AD Oliveirense SAD e AD Oliveirense correspondem a duas entidades distintas que habitam no mesmo espaço depois de há três anos, uma decisão estrutural ter colocado uma Sociedade Anónima Desportiva a gerir a equipa principal e a possuir todos os direitos económicos e desportivos desses atletas enquanto que, o clube, com 67 anos de história, ficou ao encargo de todos os escalões das camadas jovens.
Com a debandada de jogadores com contrato profissional, Marco confirmou a chamada de jovens dos juniores ao plantel principal e a importância que os produtos da formação podem vir a ter para levar o barco a bom porto: «Foram cinco juniores para a ficha de jogo mas só jogou um a titular (frente ao Vizela), ou seja, os seniores ainda têm alguns jogadores com contratos não profissionais, os estrangeiros jogaram quase todos. Se pagarem, acredito que estes jogadores vão até ao fim, porque precisam de dinheiro, se não pagarem na próxima semana vai complicar, não há seniores para jogar e então vão buscar os juniores, mas os juniores não podem jogar aos sábados e aos domingos e estão em primeiro lugar, podem perder a posição assim».
«Temos sofrido e a assembleia (Assembleia Geral Extraordinária marcada para o próximo dia 21 de março) é para isso, ou seja, nós fizemos um ultimato à SAD, para pagar aquilo que tinha de pagar pelas instalações, mas a SAD tem tido dificuldade em cumprir com este acordo. A direção obviamente que vai ter que por esta situação aos sócios e explicar muito bem este processo de insolvência porque lhes devemos isso e eles também poderão ser levados a tomar decisões sobre esta situação – pela continuidade do protocolo ou não», completou o Vice-Presidente em relação a uma das assembleias certamente mais importantes da história do clube.
Apesar de Marco Sousa ter garantido ao zerozero que, se por ventura, a equipa sénior se extinguir, o clube está disposto a recomeçar com uma equipa do mesmo escalão, importa mais olhar para as contas do futuro próximo e daquilo que o conjunto principal da AD Oliveirense pode ou não fazer. Matematicamente a permanência ainda é possível, porém, são já poucos os que acreditam em tal feito e, por isso, o cenário de uma relegação para o distrital acaba por ser o mais expectável.
Para já, o objetivo prende-se essencialmente com a tentativa de concluir a época, tarefa que não se avizinha nada fácil. A equipa técnica, a terceira da temporada, orientada por José Nuno Azevedo, saiu do cargo, sendo a equipa que estava responsável pelos juniores, a quarta da época ao leme da equipa. Os atletas que restam do início da temporada podem estar também por um fio, isto se os salários em atraso não forem regularizados brevemente. Entretanto, o plano de utilizar juniores partida atrás de partida vai, teoricamente, contra o regulamento da competição dada a ausência de contratos de trabalho para a larga maioria dos jogadores, vindos dos juniores, que podem preencher as vagas deixadas pelos assalariados que viram a cessação do seu contrato.
O que é certo é que o campeonato continua e a AD Oliveirense também. Isto depois de ter alinhado em mais um desafio, desta feita, no passado sábado, frente ao SC Braga (derrota por 2x0), novamente com uma mixórdia de atletas jovens e outros ainda do plantel inicial. Para já, no meio de tanta instabilidade, o barco continua à tona, contudo, os próximos dias serão fulcrais, quer pela decisão do recurso apresentado, quer pela decisão dos sócios em quebrar ou não o protocolo com a SAD ou quer pela continuidade ou não da equipa do concelho de Vila Nova de Famalicão em prova, no Campeonato de Portugal, e, quiçá, a garantia ou não da existência da mesma no futuro, regulada por uma SAD, claro está.